Francisco: ‘O cuidado pelos pobres está no Evangelho e na tradição da Igreja’

Em uma entrevista com o jornal italiano La Stampa, o Santo Padre fala do capitalismo, da justiça social e volta a advertir da cultura do descarte

 

Roma, 12 de Janeiro de 2015 (Zenit.org) Redacao

“Tentemos construir uma sociedade e uma e economia onde o homem e o seu bem, e não o dinheiro, estejam no centro”. O Santo Padre transmite esse desejo em uma nova entrevista, desta vez com os jornalistas italianos Andrea Tornielli, coordenador do Vatican Insider, e Giacomo Galeazzi, vaticanista de La Stampa. Ambos são autores do livro “Papa Francisco. Esta economia mata” que fala sobre o magistério social de Bergoglio. O livro, nas livrarias de língua espanhola, desde o dia 13 de janeiro, termina com uma entrevista que Francisco concedeu aos autores no começo de outubro de 2014.

Em primeiro lugar, perguntam a Francisco se acredita que o capitalismo, assim como o temos vivido nas últimas décadas, é um sistema de alguma forma irreversível. O Papa reconhece que “a globalização tem ajudado muitas pessoas a sair da pobreza, mas condenou muitas outras formas de morrer de fome”. Por isso adverte que “quando o dinheiro se transforma em um ídolo, os homens e as mulheres são reduzidos a meros instrumentos de um sistema social e econômico caracterizado, mais ainda, dominado por profundos desequilíbrios”. E dessa forma se ‘descarta’ o que não serve para esta lógica: é essa atitude que descarta as crianças e os anciãos, e que, agora, também afeta os jovens, explica o Pontífice na entrevista. Da mesma forma se mostra impressionado pela cifra de jovens chamados NeNems – nem estudam, nem trabalham – e lembra que essa ‘cultura do descarte’ ‘conduz à rejeição das crianças também com o aborto e dos idosos com a eutanásia escondida.

Aliás, Francisco indica que “não devemos considerar essas coisas como irreversíveis, não devemos resignar-nos”. E pede: “busquemos construir uma sociedade e uma economia em que o homem e seu bem, e não o dinheiro, sejam o centro”.

O Papa recordou que “a economia tem necessidade da ética, e também a política”. A este respeito indica que conheceu chefes de Estado e líderes políticos desde a sua eleição como bispo de Roma que lhe falaram sobre isso e lhe dizem que os líderes religiosos têm que ajuda-los e dar-lhes indicações éticas. Dessa forma, o Pontífice afirma, como lembrava Bento XVI na encíclica ‘Caritas in veritate’, que o faz falta são homens e mulheres com os braços elevados a Deus para rezar. Ao mesmo tempo está convencido “de que é necessário que estes homens e estas mulheres se comprometam, em todos os níveis, na sociedade, na política, nas instituições e na economia, colocando o bem comum no centro”.

O Papa diz que “os mercados e as especulações financeiras não podem desfrutar de uma autonomia completa” e que “são necessários programas, planos e mecanismos orientados para uma melhor distribuição dos recursos, da criação de trabalho, da promoção integral dos excluídos”.

Quando perguntado se se importa de ser acusado de “pauperismo”, o Santo Padre explica que São Francisco nos ajudou a descobrir a profunda ligação entre a pobreza e o caminho evangélico. E acrescenta que Jesus afirma que não é possível seguir dois mestres, Deus e as riquezas. Da mesma maneira, Francisco explica que a pobreza distancia da idolatria, do sentir-se auto-suficientes. E assim, indica que “o Evangelho não condena os ricos, mas a idolatria da riqueza, essa idolatria que nos torna insensíveis ao clamor dos pobres”.

Por fim, o Papa explica a continuidade com a tradição da Igreja neste cuidado dos pobres. Assim, recorda que um mês antes de inaugurar o Concílio Vaticano II, o Papa João XXIII disse que “a Igreja se mostra como é e como quer ser: como a Igreja de todos e, especialmente, a igreja dos pobres”. E assim, anos depois, “a eleição preferencial pelos pobres entrou nos documentos do magistério”.

Por esta razão, o Santo Padre disse que embora alguém pudesse pensar em algo novo, “no entanto, trata-se de uma atenção que tem suas raízes no Evangelho e já está documentada nos primeiros séculos do cristianismo”.

A atenção pelos pobres está no Evangelho e está na tradição da Igreja, “não é uma invenção do comunismo e não deve ser ideologizada, como às vezes aconteceu na história”, adverte o Pontífice argentino.

Para concluir a entrevista, o Santo Padre disse que “a Igreja está longe de qualquer interesse político e de qualquer ideologia: movida apenas pelas palavras de Jesus, quer oferecer sua contribuição para a construção de um mundo onde se guardem uns aos outros e onde se cuidem uns dos outros”.

 

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