Entrevista ao Pe. Luís Marinho, assistente nacional do Corpo Nacional de Escutas

“O Escutismo apresenta-se como uma proposta educativa integrada e coerente”

A sua vivência no Escutismo começou nos Exploradores e a sua primeira grande atividade foi no Acampamento Nacional de Bagunte, em 1987.

Recebeu a notícia da sua nomeação para assistente nacional do CNE com enorme surpresa. Mas, como noutras missões que já desempenhou, o gosto por enfrentar novos desafios foi determinante.

Quem é o Pe. Luís Marinho, o escuteiro?

A minha vivência no Escutismo começa no Agrupamento 421 (Seminário de Braga), onde entrei como Explorador. Foi nessa condição que participei no Acampamento Nacional de Bagunte (1987). Posteriormente, já depois da ordenação presbiteral, fui assistente dos agrupamentos de Santo Tirso de Prazins (882), Santa Eufémia de Prazins (323) e Corvite (365), do Núcleo de Guimarães. Nos últimos seis anos fui assistente do Agrupamento de Mire de Tibães (11), do Núcleo de Braga.

 

Como recebeu a notícia da sua nomeação como assistente nacional do CNE?

 

A surpresa do convite foi enorme. Foram muitos os colegas e amigos que me transmitiram a mesma surpresa pelo facto de, para além de assistente de agrupamento, não ter uma ligação muito explícita ao CNE.

Mas, como noutras missões que já desempenhei, o gosto por enfrentar novos desafios foi determinante. Teria de aprender quase tudo, teria de sair de uma comunidade onde estava há apenas seis anos (e onde estava muito bem), teria de sair da minha diocese.

Aceitei porque acredito nas imensas e credíveis possibilidades de educação de crianças e jovens que o CNE oferece, um contexto altamente favorável de proposta e formação da fé em Cristo Jesus.

 

Na sua opinião, qual a missão do assistente nacional do CNE?

 

A missão do assistente em qualquer nível da associação está claramente definida no Regulamento Geral do CNE (artigo 27.º), que cito (para não me esquecer!):

● ”Representar a Hierarquia [da Igreja Católica] no CNE.

● Animar, com os Dirigentes leigos, a comunidade escutista no sentido de ela ser espaço eclesial de evangelização e vivência da Fé”.

Dito por outras palavras, a minha missão é acompanhar, na qualidade de presbítero (padre), as pessoas e os processos: acompanhar as pessoas porque, com os elementos da Junta Central e Equipas Nacionais, somos comunidade de fé (celebramos os sacramentos da Igreja, particularmente a Eucaristia, escutamos a Palavra de Deus, rezamos… partilhamos um pouco da vida); acompanhar os processos, pois há caminhos novos a percorrer seja ao nível pedagógico, seja ao nível organizativo, porque a realidade das crianças e jovens está em constante transformação (dizem os observadores atentos que vivemos uma mudança de época; seguramente que as crianças e jovens são os que primeiramente “sofrem” o impacto de tal mudança). A fidelidade ao Evangelho obriga-nos a compreender e acompanhar esses novos caminhos.

 

Fale-nos um pouco sobre as suas áreas de intervenção?

 

No momento atual do CNE, há quatro áreas que me parece importante sublinhar, como prioridades para o assistente nacional:

● Acompanhar a implementação do novo sistema de formação, pelo lugar central que ocupa a escolha e formação dos Dirigentes do CNE. Para além de outras dimensões, a missão de educadores da fé cristã nunca pode ser esquecida.

● Promover e acompanhar o desenvolvimento pedagógico e espiritual da temática trienal, oferecendo a toda a associação os meios necessários para levar à prática e à vida a riqueza deste precioso instrumento de animação da fé.

● Dinamizar o Centro Nacional Escutista de Fátima como polo importante de animação da fé, dotando-o de um programa coerente e de futuro.

● Promover a relação com os assistentes regionais, pois são estes que asseguram a real articulação do CNE com os bispos das dioceses e realidade local.

A estas linhas prioritárias de ação devo acrescentar alguns aspetos permanentes do trabalho da assistência nacional:

● Assegurar a publicação de textos sobre a animação da fé (na Flor de Lis, meios on line do CNE e outras publicações).

● Assistência aos contingentes nacionais do CNE em atividades internacionais e em atividades de âmbito nacional.

● Relação com a Conferência Episcopal Portuguesa, particularmente a articulação com a Pastoral Juvenil de âmbito nacional.

● Relação com a Conferência Internacional do Escutismo Católico (CICE).

 

Qual a importância do Escutismo para a Igreja, enquanto movimento de juventude?

 

No meu entender, uma das principais forças do Escutismo está no facto de ser uma “proposta de longa duração”. Há um caminho bem determinado, balizado por etapas, que dura, idealmente, 16 anos. Num tempo cheio de “eventos”, onde tantas vezes as crianças e jovens parecem colecionadores de experiências (sem aparente ligação entre elas), o Escutismo apresenta-se como uma proposta educativa integrada e coerente. Não menos importante é aprendizagem da vida comunitária: pelo sistema de patrulhas, com a assunção progressiva de responsabilidades dentro do grupo onde cada jovem é acompanhado por irmãos mais velhos, o Escutismo afirma-se por esta paciente e laboriosa experiência comunitária, que é muito mais do que a soma de algumas amizades.

A vida eclesial precisa tanto destas duas dimensões! Neste contexto, a fé em Cristo Jesus, morto e ressuscitado, encarna-se em relações concretas (tantas vezes difíceis), e experimenta-se como um caminho que dura a vida toda.

 

E qual a importância da espiritualidade e religião no Escutismo nos dias de hoje?

 

Esta é uma pergunta desafiadora que o contexto desta conversa não permite desenvolver por completo, até porque seria necessário precisar bem o sentido dos termos “espiritualidade” e “religião”, e porque se trata de um debate apaixonante no âmbito do Escutismo mundial. Apenas queria referir que sem a referência a Deus a humanidade perde o sentido da eternidade. O Escutismo, sendo uma proposta de educação integral, não pode privar as crianças e jovens deste tesouro de uma vida plena, com futuro. E isto faz-se não somente por uma referência teórica a Deus, mas sobretudo pelo encontro (pela relação viva) com pessoas inteiras, que na experiência da fé unificam as suas vidas

 

O que é que o atual Programa Educativo traz de novo na parte da animação da fé, na sua opinião?

 

O CNE não é católico porque tem orações, missas e assistentes, mas porque é uma proposta de vida cuja fonte é a fé em Jesus Cristo, no seio da Igreja Católica. Haverá sempre o papel específico dos assistentes, mas qualquer Dirigente do CNE é chamado a conhecer e transmitir fielmente esta proposta de vida. O atual Programa Educativo é, portanto, fortemente integrador desta compreensão da fé, o que se torna particularmente visível nas seis áreas de desenvolvimento e na mística e simbologia.

Em todo o recente processo internacional de Renovação da Ação Pedagógica, o CNE colheu com grande proveito a intuição do Pe. Jacques Sevin quando conjugou sabiamente o método escutista e a vivência católica da fé cristã.

 

Que marca pretende deixar como assistente nacional do CNE?

 

Só no fim do caminho é que se conseguem perceber as marcas que deixamos atrás e, certamente, serão outros a melhor compreender o que foi feito.

Mas haverá marcas que vêm do meu carácter e experiência pessoal: reconheço que não sei tudo; por isso quero estar à escuta, aprender dos outros, aprender do rico património humano e espiritual do CNE, aprender da Igreja, deixar-me conduzir pelo Espírito Santo de Deus – creio firmemente que Ele é o Senhor da história.

Há, ainda, uma outra marca que intuo naquilo que o Papa Francisco nos tem transmitido: uma Igreja em saída, que não “adormece” na sua gloriosa história e parte para ir ao encontro das pessoas na sua situação real. Como poderá o CNE fazer este caminho com a Igreja? As crianças e jovens a quem procuramos servir com a nossa proposta educativa merecem que não gastemos todas as energias na organização interna, mas nos ponhamos a caminho com elas. E, acima de tudo, com alegria.

 

 

Susana Micaela Santos

Flor de Lis – Julho 2014

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