A experiência do bem é uma realidade que sempre me impressiona no contexto da família. Quanto mais a vivo e testemunho, mais estou convencido de que o futuro novo que temos de construir não pode deixar de a ter presente e de a implementar. E também por isso a família não deveria nunca deixar de estar no centro das atenções.
Esta afirmação pode parecer quase que banal e sem importância de maior, pois aponta para uma realidade que todos vivemos, ainda que ela tenha os mais diversos contornos nas mais diferentes situações. Mas é precisamente por isso mesmo, por ser tão óbvia, que muitas vezes passa despercebida e quase nunca é o suficientemente sublinhada. Por isso decidi dedicar estas linhas a sublinhar aquilo que é evidente e que todos experimentamos nas nossas famílias: o bem.
Todos, de uma maneira ou de outra, já vivemos experiências em que fomos alvo do bem puro e gratuito dos nossos familiares. Podem ser coisas tão pequeninas como dar atenção àqueles detalhes que verdadeiramente não alteram muito, mas no fundo acabam por ter uma enorme influência no bom clima que geram. Lembro-me, a este propósito, de tantos pequenos gestos que a minha mãe tinha na hora de preparar a comida, por exemplo, que era feita de determinada maneira, porque sabia que gostávamos mais assim. Ou os sítios a que os meus pais nos levavam para brincar e visitar, os amigos que convidavam, a roupa que nos compravam, a maneira como nos acordavam. Podia continuar aqui quase que indefinidamente a referenciar estes ‘quase nadas’ dos quais não me esqueço, porque através deles nos diziam (ao meu irmão e a mim) quanto nos queriam e quanto nós eramos importantes, coisas pequenas, mas que eram tão grandes porque feitas por bem e para o nosso bem.
Lembro-me também daquelas coisas que não sendo tão prazenteiras para nós eram, no entanto, boas e, por isso, os meus pais as faziam, mesmo quando viam que nós não gostávamos. As famosas idas ao médico para as vacinas, aquela comida que não sabia mesmo nada bem, a maneira como nos tínhamos de comportar em determinados sítios, quando nos apetecia brincar, estas, e tantas outras coisas, também eram feitas por bem e para o nosso bem. E quando olhamos para trás percebemos isso e damos graças por isso.
E quando os nossos pais se zangavam connosco e nos punham de castigo, porque tínhamos feito alguma asneira, ou desobedecido a alguma orientação, uma vez mais o que motivava a sua acção era o bem, o nosso maior bem.
Ao olhar para a experiência de vida certamente todos seremos capazes de encontrar facilmente as marcas destes gestos e atitudes de bondade nos quais e através dos quais fomos crescendo. Hoje sabemos que os nossos pais não eram perfeitos, sabemos que tinham as suas limitações e que até no exercício da bondade podem ter falhado, mas isso não nos impede de reconhecer como o bem que fizeram foi verdadeiramente fundamental. Também a partir daqui podemos reconhecer como fundamental o bem que fizermos aos outros.
Infelizmente esta realidade é também verdadeira quando não está presente, ou seja, também todos temos conhecimento da existência de casos em que a bondade não foi o motor da experiência familiar. Nessas situações vemos como é a própria dignidade humana que fica ferida.
E se olharmos para o presente da nossa vida familiar, continuaremos certamente a reconhecer a presença da bondade de que somos alvo por parte dos outros e da bondade que praticamos com os outros. Na relação entre marido e mulher e entre pais e filhos, continua a ser o bem, e disso não tenho a menor dúvida, o fundamento e o cimento da família.
A partir desta experiência, torna-se mais fácil perceber que a bondade não é simplesmente um feitio, ou uma maneira de ser. Muito mais do que isso é uma opção de vida. Cada um é bom na medida, e só na medida, em que optar por fazer o bem para os outros porque é bem para os outros. Também a partir desta experiência podemos mais facilmente perceber em que consiste a bondade, ou se quisermos, a santidade de Deus, aquele que é plenamente bom, porque quer para nós o nosso maior bem.
Estamos neste momento a viver um período histórico em que se estão a forjar novos paradigmas sociais e humanos. O bem e a bondade devem continuar a ser polos estruturantes desses paradigmas e, a esse nível, a família revela-se, sempre e uma vez mais, uma realidade central para o futuro que neste momento já estamos a construir.
Escrito por Juan Ambrósio e publicado em Jornal da Família, agosto de 2015