ROMA, 07 Jul. 16 / 12:00 pm (ACI).- Rezar pelos cristãos que não abandonam Raqqa porque não querem que o cristianismo desapareça, é o pedido de John, um jovem cristão que durante mais de um ano viveu sob o domínio do Estado Islâmico (ISIS) nesta cidade da Síria e que em várias ocasiões teve medo ser assassinado.
“A única coisa que pode ajudar as pessoas de Raqqa é que o ISIS abandone a cidade. Vocês também poderiam rezar por uma solução para aqueles que querem sair, mas não querem perder tudo o que têm”, expressou este jovem de 20 anos.
“Rezem pelas duas ou três famílias cristãs que disseram que se converteram ao islã desde que o ISIS chegou. Rezem por aqueles que querem permanecer na cidade, porque não querem que Raqqa permaneça sem cristãos”, exortou.
O relato de John – nome fictício por razões de segurança– foi difundido no último dia 29 de junho pela organização internacional Open Doors por ocasião do segundo ano da autoproclamação do califado, ocorrida em 2014, logo depois que o ISIS invadiu a cidade iraquiana de Mossul.
Em sua narração, este jovem recordou que esteve em Raqqa –capital do califado- quando esta cidade foi tomada pelos fundamentalistas em 13 de janeiro de 2014. Alguns dias depois disse aos cristãos “poderíamos nos converter em muçulmanos e viver uma vida normal (…), poderíamos ir embora, ou poderíamos permanecer no local e pagar a jizya (imposto para os não muçulmanos) ”.
A maioria das 1.500 famílias cristãs que viviam nesta cidade decidiram abandoná-la, mas a família de John junto com outras 50 famílias preferiu permanecer e pagar a jizya. “Aconselhei os meus pais que deveríamos ir embora da cidade, mas não queriam fazê-lo” pois não queriam perder tudo.
Logo Raqqa foi tomada pelo ISIS, o único sacerdote que havia abandonou a cidade e os terroristas começaram a destruir as igrejas e as mesquitas xiitas. Além disso, as mulheres foram obrigadas a viver sob as regras da sharia, mesmo que não fossem muçulmanas.
“Isto foi difícil para a minha mãe e para a minha irmã”, pois além de ter que se vestir completamente cobertas, não podiam sair de casa se não estivessem acompanhadas por um membro masculino da família.
Além disso, testemunhou das crueldades do Estado Islâmico, como o assassinato e decapitação de centenas de soldados sírios, entre eles haviam dois que eram cristãos. “Penduraram as cabeças ao longo do caminho que percorria para chegar ao meu trabalho”, e inclusive “vi pessoas tirando selfies neste local”.
“Eles matam por muitas razões. Devemos ser conscientes disso. Quando falo com eles, devo saber quais palavras tenho que utilizar. Qualquer palavra equivocada pode ofendê-los. Ao ver todas essas atrocidades, não parecem pessoas, parecem monstros”, assinalou.
John disse que pouco a pouco a vida foi retomando seu caminho, os negócios foram abrindo novamente, mas sob as regras do califado, e ele devia ter sempre em suas mãos o documento que o assinalava como cristão e que havia pagado o imposto de submissão.
O jovem contou que uma determinada ocasião, um grupo de islamistas desceram de um automóvel e gritaram com ele, pois estava com um corte de cabelo ocidental. Um deles desceu e logo depois de recrimina-lo, voltou para carro para pegar a sua pistola.
“Agarrei o papel declarando que eu era cristão e estava pagando o imposto. Várias pessoas se aproximaram para ver o que estava acontecendo. Quando lhe mostrei o papel, pegou nas suas mãos, leu e me entregou novamente. Olhou nos meus olhos, deu meia volta e foi embora”, recordou.
John disse que o califado ensina que devem odiar o Ocidente e que embora em várias ocasiões havia conversado normalmente com os jihadistas, no trabalho ou no ginásio, as coisas mudavam quando “descobriam que ele era cristão”. “Eles me aconselhavam a converter-me em muçulmano”, assinalou.
“Nunca imaginamos que isto poderia acontecer na nossa cidade. Raqqa era uma cidade normal na Síria, como todas as outras cidades. Nós, cristãos, éramos respeitados pelo resto da população. Não era uma população islâmica radical. Em minha opinião o que o ISIS está fazendo não é o verdadeiro islã. Vivi com muçulmanos a vida inteira, nos respeitávamos mutuamente, vivíamos pacificamente juntos”, afirmou.
Finalmente John deixou Raqqa para continuar seus estudos e agora vive em outra cidade síria. “Talvez não tenha água e eletricidade todos os dias como tinha em Raqqa, mas me sinto seguro, interiormente estou em paz”.
Essas experiências lhe ajudaram a fortalecer sua fé. “Confio mais em Deus. Algumas vezes as explosões ocorriam muito próximo de onde eu morava e trabalhava. Realmente vi a proteção de Deus sobre mim”, afirmou.