A família no centro das atenções

(por Juan Ambrósio, em Jornal da Família, agosto/setembro 2014)

6. Um tempo diferente…

Na altura em que escrevo estas linhas já tudo parece ter a marca das férias. Na Faculdade de Teologia, onde normalmente passo grande parte do meu tempo laboral, os corredores estão praticamente vazios, pois os alunos estão de férias. Em casa, onde agora posso estar mais tempo, e onde estou neste momento, também tudo está sossegado e impera o silêncio. A minha mulher está a trabalhar (eu também estou, mas num ambiente muito mais descontraído como podem imaginar), o André está na praia, também a trabalhar (este ano está a ajudar a dar umas aulas de kitesurf), e o Filipe foi passar uns dias com os amigos ao Algarve, depois de um intenso período de estudo para a realização dos exames de 12º ano.

Digo isto, para sublinhar que neste tempo, com cheiro a férias, é possível mudar as rotinas e fazer coisas diferentes. Mas será que é isso que verdadeiramente fazemos?

Ao pensar um pouco nisto, confesso que fico com algumas dúvidas. É verdade que em tempo de férias os horários mudam e as rotinas podem, de facto, ser diferentes. É verdade, também, que, para todos aqueles que têm oportunidade, até muda a geografia onde normalmente se costumam movimentar. Muitos vão para outros sítios, fazem coisas diversas, com horários igualmente diversos. E, apesar disso, confesso que a pergunta anteriormente feita continua a estar presente.

Vou ser mais explícito, e tentar fazer a reflexão no âmbito da experiência familiar, de modo a deixar mais clara a dúvida que se me levanta e que quero convosco partilhar.

É claro que em tempo de férias podemos ter mais tempo para estarmos juntos com os nossos familiares. Mas será que este “estarmos mais tempo juntos” equivale a darmos mais tempo à família, pondo-a no centro das nossas atenções e prioridades?

Desculpem-me a insistência na pergunta. Verdadeiramente ela é também um pequeno artifício para ajudar a focar a vossa atenção naquilo que quero partilhar. Eu sei, que para muitos de nós, este tempo possibilita, de facto, maior disponibilidade para a família e para estarmos e fazermos coisas em conjunto. Ainda bem que assim é, e por essas experiências devemos agradecer profundamente uns aos outros.

Mas o que quero dizer é que, apesar dessa diferença, e insisto ainda bem que ela existe, nem sempre a nossa mentalidade muda. Muitas vezes guardamos para realizar no tempo de férias aquelas coisas que não fomos sendo capazes de fazer ao longo do ano. Ao chegar a oportunidade podemos, então, dedicar-nos a elas. Isso também é bom, pois ajuda a quebrar as rotinas, tantas vezes monótonas, em que temos de andar envolvidos. Mas talvez ao fazer isso não exista assim uma mudança tão grande no que à experiência familiar diz respeito, pois, apesar de estarmos juntos, cada um continua centrado nas suas coisas.

É por isso que podemos fazer destas férias em concreto uma possibilidade de mudança. Porque não pensar e planificar, em família, momentos e actividades que possam ajudar a viver e aprofundar mais intensamente essa experiência de ser família? Ou seja, não simplesmente momentos para estarmos juntos, mas momentos para nos ajudarmos a ser e enriquecer mutuamente enquanto família!

As possibilidades são imensas e têm o limite da nossa criatividade e ousadia. E, em bom rigor, nem é preciso mudar de sítio para introduzir essa diferença e mudança. E, também, não é necessário obrigatoriamente ter de fazer coisas espectaculares, ou muito diferentes, daquilo que costumamos fazer, se bem que essa novidade também possa ser bem-vinda, caso seja possível e a consideremos importante.

Mas penso também em coisas mais simples, como por exemplo um ou mais serões (ou outros momentos) para partilhar aquilo que foi o ano enquanto família. O que nos preocupou e ocupou, as vitórias e conquistas, o que não foi possível alcançar. E não só do ponto de vista individual, mas do ponto de vista familiar. Como fui como marido, ou esposa, irmão ou filho?

Olhar para o passado, mas também olhar para o futuro. Que projecto queremos assumir enquanto família? O que podemos e devemos fazer para intensificar a experiência familiar? E que compromisso podemos, por exemplo, assumir como família no seio da comunidade, humana e crente, em que vivemos. Tudo isto pode, igualmente, constituir oportunidade para rezarmos em conjunto e também a esse nível intensificar a experiência de ser família.

Ser família e não simplesmente estar juntos, esse é um dos desafios em tempo de férias.

E espero, sinceramente, que para todos seja possível, neste verão, um tempo diferente, não só pela diferença dos espaços e das rotinas, mas pela experiência familiar desse tempo. 

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