A família no centro das atenções (por Juan Ambrósio, em Jornal da Família, Julho 2014)

5. Não podemos estar distraídos ou ‘fazer de conta’ que não é connosco

Recentemente tive a oportunidade de participar num encontro onde se reflectiu sobre políticas públicas da família em Portugal. Do que lá se disse, e algumas coisas foram mesmo muito interessantes, partilho aqui duas notas.

 

A primeira sublinha algo que todos nós sabemos, mas nem sempre temos devidamente presente. A Constituição da República Portuguesa no seu artigo 67º, nº 1 afirma explicitamente o seguinte: “A família, como elemento fundamental da sociedade, tem direito à protecção da sociedade e do Estado e à efectivação de todas as condições que permitam a realização pessoal dos seus membros.”

A afirmação é, apesar de muito genérica, bem clara (o nº 2 deste mesmo artigo concretiza um pouco mais ao especificar algumas áreas nas quais o Estado tem como incumbência proteger a família). Numa altura em que tanto se fala do Tribunal Constitucional e da sua importância para proteger aqueles valores que são considerados essências para a identidade de Portugal, seria igualmente importante ter bem presente a realidade da família. Fazem bem os partidos em remeter para o Constitucional todas aquelas normas e leis que parecem atingir o que consideramos essencial. Apesar do jogo político que existe a este nível, como todos sabemos, isso é algo de essencial e do qual não podemos jamais prescindir. Pena é que em relação a outras temáticas, tão ou mais fundamentais do que aquelas que ultimamente se tem falado, como é claramente tudo aquilo que se relaciona com a família, a atitude dos partidos, bem como a dos cidadãos, entre os quais podemos e devemos incluir todos aqueles que se dizem cristãos, não seja tão diligente e pressionante. Não tenhamos dúvidas, da defesa clara e inequívoca da família depende também, em grande parte, o futuro do País que queremos construir.

A segunda nota que quero partilhar convosco tem a forma de uma simples afirmação tantas vezes dita a propósito de tantas outras coisas. A certa altura foi afirmado que, em relação às nossas responsabilidades enquanto crentes acerca de tudo aquilo que diz respeito à família, não podemos estar distraídos, nem ‘fazer de conta’ que não é nada connosco.

Foi esta afirmação, tão simples e banal, que inspirou esta minha partilha, pelo que acabei também por tomá-la como seu título.

É bem verdade que às vezes, se calhar demasiadas vezes, parecemos distraídos, ou ‘fazendo de conta’ que muitas das dificuldades porque passam as famílias não têm nada a ver connosco enquanto cristãos. Sim, afinal não somos nós que fazemos as leis, nem somos nós que as implementamos, nem temos competência para punir quem não as cumpra. Mas quem elege os nossos representantes? Será que aquilo que eles pensam e fazem nesta área é suficientemente tido em conta, por nós, nos diversos momentos em que somos chamados a elegê-los? Quando temos de escolher, que peso tem o seu posicionamento acerca das questões relativas à família? É esse um critério de destaque e essencial, ou surgem muitos outros à frente?

Esta banal frase remeteu-me igualmente para algo que ultimamente me tem feito pensar, no que diz respeito à nossa maneira de agir enquanto cristãos, e que tem a ver com o que nos é sugerido pelo Papa Francisco no nº 24 da Exortação Evangelii Gaudium.

Também em relação a todas as temáticas relativas à família devemos “primeirear”, envolver-nos, acompanhar, frutificar e festejar. Na verdade não podemos simplesmente remeter para os outros algo de tão fundamental. Temos de ser nós, enquanto famílias e enquanto comunidade crente, a tomar a iniciativa (primeirear). Somos nós que devemos ir ao encontro de todos aqueles que estão em situação de fragilidade e necessidade, mas somos igualmente nós que devemos tomar a iniciativa, todas as iniciativas, que possam ajudar a defender e promover a família. A este nível, temos de reconhecer que podemos ousar mais. Essa deve ser uma causa na qual devemos comprometer-nos (envolver-nos) sem reserva.  Isso implica, obviamente um acompanhamento cuidado e permanente de pessoas e situações. É dessa atitude que podem surgir frutos diferentes e é todo este itinerário que devemos celebrar.

É claro que a nossa fé nos diz que em todo este processo não estamos sozinhos. Nem tudo depende das nossas forças, sabemo-lo bem. E, contudo, sem a nossa iniciativa, sem o nosso envolvimento e compromisso, sem os frutos que também dependem de nós e sem a celebração nada certamente se alterará.

Não é que Deus não esteja presente, não é que Ele não apoie, suporte e estimule, mas é que Ele não nos substitui e o que nos compete fazer, só nós o podemos fazer, ou ficará por ser feito.

 

Por Juan Ambrosio

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